Histórico e procedimento
Em 25/06/2021, o governo federal apresentou ao Congresso o Projeto de Lei nº 2.337/2021 (“PL 2337/21”), contendo a proposta da 2ª fase da reforma tributária, com enfoque na tributação sobre a renda verificada por pessoas físicas, pessoas jurídicas e em investimentos no mercado financeiro e de capitais, inclusive fundos de investimento (“Proposta”). Veja, nesse sentido, nossoInformativo de 16/07/2021.
A Proposta teve como relator o Deputado Celso Sabino (PSDB-PA) e, determinada sua apreciação em regime de urgência, foi objeto de uma série de discussões entre deputados e representantes do Ministério da Economia, da Receita Federal do Brasil e de instituições representativas de setores da economia e de estados e municípios durante os meses de julho e agosto, resultando na apresentação de Emendas e Substitutivos.
Submetido à apreciação do Plenário da Câmara dos Deputados, o Substitutivo ao PL teve seu texto aprovado na sessão de 01/09/2021, assim como os Destaques na sessão de 02/09/2021, tendo apenas um sido aprovado (redução de 20% para 15% da alíquota do IRRF sobre lucros e dividendos distribuídos).
Uma vez que o PL teve seu início na Câmara, seguirá agora para o Senado, onde será analisado e votado. Em caso de alterações, retornará à Câmara para análise apenas das alterações (que podem ser mantidas ou pode-se retornar ao texto original). Percorridas essas etapas, o PL seguirá para sanção ou veto pelo presidente da República, no todo ou em parte.
Vale destacar que o imposto de renda instituído ou aumentado somente poderá ser cobrado no exercício financeiro seguinte ao da publicação da lei resultante da Proposta.
Alterações previstas para os fundos de investimento
A tributação dos fundos de investimento é um dos temas de maior debate no âmbito do PL 2337, possuindo um capítulo específico sobre alterações no tratamento tributária dos diferentes tipos e classificações de fundos. Uma das principais alterações é a previsão do “come-cotas” no regime geral para fundos constituídos como condomínios fechados (“fundos fechados”).
Além disso, importante alteração promovida na última versão do Substitutivo ao PL 2337 é a previsão para que os lucros e dividendos distribuídos para carteiras de fundos de investimento titulares de valores mobiliários não se sujeitem ao imposto de renda retido na fonte, devendo o valor bruto dos dividendos ser incorporado ao valor patrimonial das cotas.
Há também previsão no sentido de que não estão sujeitos à incidência do imposto de renda na fonte os lucros e dividendos distribuídos por valores mobiliários aplicados por recursos das provisões, reservas técnicas e fundos de planos de benefícios de entidade de previdência complementar, sociedade seguradora e FAPI, bem como de seguro de vida com cláusula de cobertura por sobrevivência.
Para melhor entendimento dos ajustes propostos, segue quadro comparativo entre a norma tributária em vigor e o texto aprovado pela Câmara e enviado ao Senado em 03/09/2021, incluindo primeiras observações:
Fundo | Tributação atual | Substitutivo enviado ao Senado (03.09.2021) | Observações/Destaques |
Fundos abertos | •Fundos longo e curto prazo •Tabela regressiva (22,5% a 15% ou 22,5% a 20%) •Come-cotas (15% ou 20%) duas vezes ao ano | •Fundos longo e curto prazo •Tabela regressiva (22,5% a 15% ou 22,5% a 20%) •Come-cotas (15% ou 20%) anual (novembro) | •Simplificação do come-cotas |
Fundos fechados | •Resgate/liquidação e amortização: conforme FIA ou outros tipos de fundos (i.e. curto ou longo prazo) •Sem come-cotas | •Fundos longo e curto prazo •Tabela regressiva (22,5% a 15% ou 22,5% a 20%) •Come-cotas (15% ou 20%) anual (novembro) •Tributação do “estoque” (15% em nov/2022 ou 6% em maio/2022) – Exigência de antecipação pelo cotista (come patrimônio) •Tributa reorganizações (cisão, incorporação, fusão e transformação) | •Não estão expressamente incluídos no regime geral dos fundos fechados: FII; Fiagro; FI-INR; FIP, FICFIP, FIEE qualificados como entidades para investimentos; FIP não qualificados como entidades de investimento; FIP-IE e FIP-PD&I; FIA e FICFIA; FIDC da Lei 12.431/11 e do art. 25 do Substitutivo; e ETF →Outros fundos sujeitos a normas especiais também deveriam ser enquadrados no regime geral de fundos fechados (por exemplo os FI-Infra e FIC FI -Infra da 12.431) •Discussão sobre tributação do “estoque” |
FIA | •Alíquota: 15% •67% de ações negociadas no mercado à vista de bolsa •Sem come-cotas •Definição em instrução sobre ativos (Brasil e exterior) equiparados a ações para fins de enquadramento | •Alíquota: 15% •75% de ações negociadas no mercado à vista de bolsa •Sem come-cotas •Definição em lei de ativos (Brasil e exterior) equiparados a ações para fins de enquadramento | •Aumento da porcentagem de composição mínima da carteira •Previsão sobre ativos equiparados mais restrita em relação ao exterior •Mantida regra atual de desenquadramento •Ausência de regra sobre reenquadramento |
FIP, FIC-FIP e FIEE | •Alíquota: 15% •67% de ações de S.A., debêntures conversíveis e bônus de subscrição •Requisitos para alíquota zero aos não-residentes (40% de cotas ou rendimentos e máximo de 5% da carteira em títulos de dívida | •FIP entidades de investimento →Alíquota: 15% →Critério da carteira passa a ser apenas o regulatório (CVM) →Revogação dos requisitos para alíquota zero aos não-residentes (40% de cotas ou rendimentos e máximo de 5% da carteira em títulos de dívida) →Distribuição ficta na alienação de ativos da carteira •FIP não-entidade de investimento →Tributado como Pessoa Jurídica →Tributação do “estoque” (15% em nov/2022 ou 6% em maio/2022) – Exigência de antecipação pelo cotista (come patrimônio) | •Equiparação da regra fiscal à regra de enquadramento da carteira da CVM →Resolve discussões sobre investimento por FIP em cotas de FIP, sociedades limitadas etc. →Facilitta a entrada e tratamento tributário de não-residentes (não podem ser oriundos de paraíso fiscal) •Tributação pelo tipo de FIP: investimento ou patrimonial •Discussão sobre tributação do “estoque” |
FIP-IE e FIP-PD&I | •Sem alterações, sendo preservadas as regras tributárias específicas vigentes para estas categorias de FIPs. | • Ajuste de redação, excluindo referência à amortização e definindo a base de cálculo do imposto de renda na fonte sobre distribuições | •Não propõe alterações semelhantes àquelas pre-vistas para os FIP da Lei 11.312 |
FII | •Alíquota de 20% para rendimentos distribuídos, alienação e resgate •Isentos os rendimentos em bolsa para pessoas físicas (i.e. distribuições semestrais por FII listado com mais de 50 cotistas) | •Alíquota de 20% para rendimentos distribuídos, alienação e resgate •Isentos os rendimentos em bolsa para pessoas físicas (i.e. distribuições semestrais por FII listado com mais de 50 cotistas) | •Sem alterações para o FII |
Fiagro | •Alíquota de 20% para rendimentos distribuídos, alienação e resgate •Isentos os rendimentos em bolsa para pessoas físicas (i.e. distribuições por Fiagro listado com mais de 50 cotistas) | •Alíquota de 20% para rendimentos distribuídos, alienação e resgate •Isentos os rendimentos em bolsa para pessoas físicas (i.e. distribuições por Fiagro listado com mais de 50 cotistas) | •Sem alterações para o Fiagro |
ETF Renda Variável | •Equiparado ao FIA (pela RFB) | •Criação de regra própria para ETF Renda Variável, relativo a índices de ações, imobiliários, de criptoativos, moedas e commodities •Requisitos: →Possuir, no mínimo, 95% de seu patrimônio aplicado em ativos que componham o índice de referência →Ter o índice de mercado reconhecido pela CVM •Integralização, alienação e resgate (em dinheiro ou ativos): replicadas regras já previstas em âmbito de IN RFB 1585: →Alienação: ganhos líquidos ou de capital →Resgate: alíquota de 15% •Em caso de desenquadramento, sujeita-se à tributação como fundos de curto ou longo prazo, pelas tabelas regressivas | •Mitiga o risco de questionamentos sobre a tributação de ETF de Renda Variável relativo a determinados índices (como criptoativos) •Regra de desenquadramento pode comportar diferenças entre aberto e fechado |
ETF Renda Fixa | •Alíquotas de 25% a 15% a depender do prazo médio de repactuação da carteira | •Sem alteração quanto ao regime tributário e às alíquotas (25%, 20% ou 15% a depender do prazo médio de repactuação da carteira) •Alterações na redação sobre (i) o momento de consideração do cálculo do prazo médio de repactuação da carteira e (ii) a metodologia de cálculo do prazo médio de repactuação | •Ajustes em relação ao prazo médio de repactuação da carteira |
FIA Mercado de Acesso | •Sem alterações | •Sem alterações | |
Fundos com 85% em Ativos Incentivados e FIC com 95% de cotas dos Fundos Incentivados (Lei nº 12.431) | •Alíquota 0 (zero) do IRRF para pessoas físicas e investidores não residentes da Res. CMN 4373 não enquadrados como paraíso fiscal, sobre os rendimentos e ganhos •Alíquota de 15% do IRRF para pessoas jurídicas (lucro real, presumido, arbitrado, isenta e optante do Simples Nacional), sobre os rendimentos e ganhos •Mínimo de 67% da carteira do FI-Infra em ativos incentivados em até 180 dias da primeira integralização de cotas •Mínimo de 85% da carteira do FI-Infra em ativos incentivados em até 2 anos da primeira integralização de cotas •Não atendimento das condições dispostas em lei implica a liquidação ou transformação do fundo em outra modalidade de fundo de investimento ou de fundo de investimento em cota de fundo de investimento | •Sem alterações | •FI-Infra e FIC FI-Infra não foram previstos na regra de exceção do regime geral dos fundos fechados. Não deveria ser aplicada a regra geral em razão de haver regra específica na Lei 12.431, mas pode haver discussões com a RFB, em especial para pessoas jurídicas •Tanto para o FI-Infra quanto o FIC FI-Infra |
FIDC | •Tratamento como fundos de renda fixa, pela tabela progressiva e segregados quanto ao prazo (abertos com come-cotas e fechados sem come-cotas) •Tratamento específico se fechado e relacionado a projetos de infraestrutura (Lei nº 12.431/2011) | •Criação de regra própria para FIDC (aberto ou fechado), que será tributado à alíquota de 15% do IRRF (resgate, alienação e distribuição de rendimentos) desde que observe algumas características: →Composição do PL mínimo do fundo de 75% em direitos creditórios →Mesmo cotista não detenha, isolada ou cumulativamente com pessoas a ele ligadas, mais do que 25% da totalidade das cotas emitidas pelo fundo, ou cujas cotas lhe deem direito ao recebimento de rendimento superior a 25% do total de rendimentos •FIC FIDC: mantenha, no mínimo, 95% de seu PL em cotas de FIDC •Em caso de desenquadramento, sujeita-se à tributação como fundos de curto ou longo prazo, pelas tabelas regressivas •Demais FIDCs: tratamento como fundos de renda fixa, pela tabela progressiva e segregados quanto ao prazo (abertos com come-cotas e fechados sem come-cotas) (com exceção dos fechados relacionados a projetos de infra) | •Regra de desenquadramento pode comportar diferenças entre aberto e fechado |
O presente informativo consolida as principais alterações que podem impactar a tributação de operações com fundos de investimento. Divulgaremos nos próximos dias outros informativos tratando sobre as alterações para aplicações financeiras e operações em bolsa, bem como que posam impactar de forma mais direta os gestores de fundos e seus sócios.
Nossa equipe encontra-se à disposição para quaisquer esclarecimentos, informações adicionais ou suporte relativamente aos assuntos tratados neste informativo.
Este informativo foi elaborado exclusivamente para nossos clientes e apresenta informações resumidas, não representando uma opinião legal. Dúvidas e esclarecimentos específicos sobre tais informações deverão ser dirigidos diretamente ao nosso escritório.
Tributário em Mercado Financeiro e de Capitais
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Setembro de 2021.