CVM divulga esclarecimentos sobre parâmetros para caracterização dos “tokens de recebíveis” ou “tokens de renda fixa” como valores mobiliários

A Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”) avançou mais um passo em direção à regulamentação dos criptoativos no mercado de valores mobiliários. Complementando o Parecer de Orientação CVM nº 40 (“PO CVM 40”) e reforçando a atração de competência da CVM, o Ofício Circular SSE nº 04/23, publicado em 03 de abril de 2023 (“OC 04/23” ou “Ofício Circular”), indica a natureza de valor mobiliário dos Tokens de Recebíveis e dos Tokens de Renda Fixa (em conjunto, “TR”), observadas determinadas características.

 Além dessa importante conceituação, o Ofício Circular abre a possibilidade para que ofertas públicas de distribuição de TRs que observem algumas especificidades sejam realizadas por plataformas eletrônicas de investimento participativo (crowdfunding), nos termos da Resolução CVM nº 88, de 27 de abril de 2022 (“Resolução CVM 88”), e reforça que tais ofertas públicas devem conter informações sobre os criptoativos, nos termos das recomendações do PO CVM 40.

 

1.   TOKENS COM NATUREZA DE VALORES MOBILIÁRIOS

No mesmo sentido das manifestações anteriores da CVM, em especial do PO CVM 40, a Autarquia observa que a tecnologia sob a qual são escriturados e emitidos os ativos não têm o condão de alterar sua natureza jurídica, significando que se um ativo representar um valor mobiliário, deverá ter tratamento regulatório correspondente ao valor mobiliário que representa.

 Assim, embora os criptoativos não estejam incluídos no rol de valores mobiliários da Lei 6.385, de 07 de dezembro de 1976, os agentes de mercado devem sempre analisar a característica de cada um para determinar se deve receber tratamento de valor mobiliário ou não.

 Nesse sentido, o escopo da referida análise deve contemplar não apenas os tokens que são representação digital dos valores mobiliários taxativamente previstos na Lei (como os certificados de recebíveis em geral), mas aqueles que se enquadrem no conceito aberto de contrato de investimento coletivo (“CIC”).

Em outras palavras, portanto, além da consideração do criptoativo como valor mobiliário com base no ativo que representa (“Valor Mobiliário por Representação”), também é possível que seja assim considerado pelo conceito aberto de CIC (“Valor Mobiliário por Natureza”), desde que atendidos os parâmetros introduzidos pelo PO CVM 40 e aprofundados pelo Ofício Circular para verificação dos elementos, com base em Teste de Howey.

 Se após a análise acima mencionada, um token for representativo de um valor mobiliário, a utilização de DLT (Distributed Ledger Technology) por si só não descaracteriza sua natureza, devendo ser observada nesses casos a regulação do mercado de capitais aplicável não somente à oferta e ao emissor respectivos, mas também à intermediação, escrituração, custódia, depósito centralizado, registro, compensação, liquidação e administração de mercado organizado de tais ativos.

 

2.   NATUREZA DOS TOKENS DE RENDA FIXA E DOS TOKENS DE RECEBÍVEIS

Embora as ponderações acima sejam aplicáveis a todos os criptoativos, o Ofício Circular dá ênfase aos Tokens de Recebíveis e aos Tokens de Renda Fixa, por terem sido observadas ofertas públicas de ativos desta natureza que atendiam, na visão da CVM, aos requisitos para serem considerados como valores mobiliários.

 Assim, a SSE utiliza no Ofício Circular os TRs como exemplo para demonstração dos parâmetros que são observados pela CVM na avaliação de um criptoativo como valor mobiliário, ilustrando os conceitos de Valor Mobiliário por Representação e Valor Mobiliário por Natureza.

  • Valor Mobiliário por Representação: De acordo com o Ofício Circular, os TRs geralmente (i) possuem estrutura de remuneração fixa, variável ou mista ao investidor; (ii) podem ser representativos, vinculados ou lastreados em direitos creditórios ou títulos de dívida; (iii) os pagamentos de juros e amortização ao investidor decorrem do fluxo de caixa de um ou mais direitos creditórios ou títulos de dívida; (iv) tem direitos creditórios ou títulos de dívida cedidos ou emitidos em favor dos investidores finais ou de terceiros que custodiam o lastro em nome dos investidores; e (v) tem sua remuneração definida pelo emissor do TR, seu cedente, estruturador ou terceiro envolvido na operação.

Dessa forma, considerando a definição de operação de securitização constante do artigo 18, parágrafo único da Lei nº 14.430, de 03 de agosto de 2022 (“Marco Legal da Securitização”, “Lei da Securitização” ou “Lei 14.430”), abaixo transcrito, a Autarquia entende que os TRs são ativos que podem possuir, observadas as características acima, natureza de valor mobiliário:

É considerada operação de securitização a aquisição de direitos creditórios para lastrear a emissão de certificados de recebíveis ou outros títulos e valores mobiliários perante investidores, cujo pagamento é primariamente condicionado ao recebimento de recursos dos direitos creditórios e dos demais bens, direitos e garantias que o lastreiam

 

  • Valor Mobiliário por Natureza: Além dos elementos indicativos da natureza dos criptoativos como representações de títulos de securitização, a CVM também indica que os TRs geralmente são ofertados publicamente por meio de “exchanges”, “tokenizadoras” ou outros meios.

Isso significa que ainda que os tokens não sejam representativos de operações de securitização, nos termos da Lei 14.430, a depender de suas estruturas, podem ser considerados como valores mobiliários em decorrência da sua natureza de CIC, rememorando os requisitos elencados no PO CVM 40 para decidir acerca da natureza de uma ativo como valor mobiliário, com base no Teste de Howey.

Assim, o Ofício Circular reforça que se verifica, em ofertas de TRs, evidência de investimento, formalização, caráter coletivo do investimento, expectativa de benefício econômico e oferta pública.

O Ofício destaca ainda que merecerá, nessa análise, especial consideração o requisito do Teste de Howey que trata de o benefício econômico resultar de esforços preponderantes de empreendedor ou de terceiros, condição essa que também resta atendida, na visão da CVM, caso os “tokens (sejam) lastreados, vinculados ou representativos de direitos creditórios ou títulos, cujas atividades de seleção, análise de risco, precificação, aquisição, manutenção, custódia ou gestão, seja do(s) direito(s) creditório(s) ou de seu fluxo de caixa, inclusive em atividades de cobrança, sejam desempenhadas, em conjunto ou isoladamente, por terceiros que não o próprio investidor”.

Por fim, o Ofício Circular esclarece que nas ofertas públicas em que houver coobrigação do cedente ou de terceiros para adimplemento das obrigações dos tokens, a natureza de contrato de investimento coletivo é evidenciada pelo esforço direto do cedente ou terceiro para o sucesso do investimento tokenizado, ainda que haja apenas a cessão direta de determinado direito creditório em benefício do investidor.

 

3.   UTILIZAÇÃO DE PLATAFORMAS DE CROWDFUNDING PARA OFERTAS DE TRs:

Atraída a competência da CVM, o OC 04/23 esclarece ainda que ofertas de TRs com alvo máximo de captação de até R$15.000.000,00 (quinze milhões de reais) podem ser emitidas por companhias securitizadoras de capital fechado sem registro na CVM, bem como que as respectivas ofertas podem ser conduzidas por meio das plataformas registradas sob o regime da Resolução CVM 88.

Nesse sentido, títulos de securitização podem ser tokenizados e ofertados via plataformas de crowdfunding, compatibilizando a tecnologia dos tokens com a tecnologia utilizada na infraestrutura dessas plataformas.

Nesses casos, deverão ser observados em especial os requisitos que concernem à receita bruta anual da emissora, que deverá ser securitizadora enquadrada como sociedade empresária de pequeno porte ou, caso seja instituído regime fiduciário, o patrimônio separado deverá ser considerado como emissor para fins de atendimento dos limites de receita bruta estabelecidos na Resolução CVM 88.

Assim, o patrimônio separado não poderá extrapolar a receita bruta anual de R$40.000.000,00 (quarenta milhões de reais), individualmente, ou de R$80.000.000,00 (oitenta milhões de reais), considerando o grupo econômico do patrimônio separado, sendo a oferta do ativo objeto do patrimônio separado limitada aos R$15.000.000,00 (quinze milhões de reais) por ano calendário.

 

Este informativo foi elaborado exclusivamente para nossos clientes e apresenta informações resumidas, não representando uma opinião legal. Dúvidas e esclarecimentos específicos sobre tais informações deverão ser dirigidos diretamente ao nosso escritório.

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