BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE O IMPACTO DA MP 881/2019 (MP DA LIBERDADE ECONÔMICA) NAS RELAÇÕES CONTRATUAIS E EMPRESARIAIS

A primeira observação a ser feita sobre a MP 881 no âmbito do direito contratual é a de que deve se presumir a liberdade de exercer as atividades econômicas e a boa-fé dos contratantes (art, 2º, I e II), e que caso determinada disposição contratual prevista pelas partes não disponha contra a Lei, toda vez que o contrato for interpretado por qualquer órgão da administração pública, (art. 3º, V), deverá prevalecer o que as partes estabeleceram. Entretanto, tal presunção não será aplicável em relação ao direito tributário e econômico (art. 1º, § 2).

Para explicitar o princípio da MP 881, foi promovida a alteração do artigo 421 do Código Civil, para incluir que qualquer Poder, portanto, inclusive o Poder Judiciário, deve promover o ”princípio da intervenção mínima” na relação contratual, e que a revisão contratual deve ser “excepcional” (vide art. 2º, III e art. 7º).

A consequência lógica da norma é a de que a regra trará maior segurança jurídica entre os contratantes, prevalecendo o disposto no contrato, exceto no que for contrário à Lei.

Contudo, vale notar que o Código Civil de 2002 foi estruturado em um sistema de “cláusulas abertas”, ou seja, que admitem interpretação judicial para restabelecer o equilíbrio entre as partes sempre que necessário.

Podemos mencionar, dentre outras, as seguintes hipóteses de intervenção judicial expressamente previstas no Código Civil: quando o contrato não cumprir sua função social; quando a boa-fé objetiva não for verificada; quando se verificar enriquecimento ilícito ou sem causa de uma das partes; quando ocorrer onerosidade excessiva para o cumprimento de determinada obrigação; quando uma multa for considerada muito onerosa; e quando houver vício de vontade na formação do contrato. Essas normas derivam da própria Constituição, de forma a preservar a dignidade da pessoa humana.

Como estamos falando de “normas com conceito aberto”, elas podem ter seu alcance redefinido, conforme a evolução social.

Existem vários casos de interferência exagerada do Poder Judiciário nas relações contratuais, e a nova norma deve trazer luz ao tema, no sentido de coibir situações de exagerada defesa de interesses de particulares, quando as partes são maiores e capazes, e não estivermos diante de contratos de consumo, ou de atividade especificamente regulada.

Assim, podemos afirmar que a desejada segurança jurídica de fazer prevalecer a autonomia absoluta da vontade das partes não será plenamente alcançada, porém as partes deverão estar muito mais atentas ao assinar seus respectivos contratos, pois haverá uma tendência de menor interferência do Poder Judiciário na relação, se restringindo aos casos excepcionais.

Ainda no âmbito do Código Civil, para as relações interempresariais (entre empresas) foram criados os artigos 480-A e B, para que as partes possam estabelecer parâmetros para interpretação de requisitos de revisão ou de como o contrato deve ser resolvido, bem como prevê que as empresas devem ser consideradas simétricas e que os riscos do negócio foram previstos e assumidos pelas partes.

Como consequência, entendemos que:

1) a aplicação do Código de Defesa do Consumidor para as pessoas jurídicas, sob alegação de inferioridade técnica ou disparidade econômica, tende a ser afastada pelo Poder Judiciário;

2) fica afastada a possibilidade de decisão por equidade (justiça), pois a aplicação da Lei e seus princípios é subsidiária, seja perante o Poder Judiciário ou arbitragem entre empresas;

3) as cláusulas de limitação ou exoneração de responsabilidade ficam melhor defendidas, o que deve ser motivo de bastante cuidado entre os contratantes;

4) multas consideradas exageradas só devem ser revistas em casos excepcionais; e

5) as cláusulas de arbitragem e de foro de eleição devem ser mantidas, conforme contratado.

Para os negócios jurídicos empresariais a MP 881 foi além, pois previu que deve haver a garantia de que tais negócios serão objeto de livre estipulação e que as regras empresariais devem ser aplicadas de forma subsidiária (art. 3º, VIII), ou seja, as partes podem pactuar, inclusive contra as regras de direito empresarial, e mesmo assim devem ser consideradas válidas.

Adicionalmente, a MP impõe maior restrição da possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica, com modificação do artigo 50 do Código Civil, para atingir os bens dos sócios. Isso leva a necessidade ainda maior de análise de garantias contratuais, sob pena de que o credor não consiga alcançar os bens dos sócios.

Muitos pontos ainda serão levantados a respeito da MP 881 antes de sua conversão em Lei, e caso seja convertida, muito ainda se debaterá perante o Poder Judiciário sobre o seu alcance.

Dessa forma, entendemos que as partes devem ter muito mais cuidado ao assinar contratos, e todas as cláusulas contratuais devem ser devidamente discutidas e entendidas à exaustão, de forma que os contratantes não sejam pegos de surpresa no momento de execução do contrato.

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