Retrospectiva 2023 – Direito Societário

Dentre os temas que tiveram destaque este ano para o Direito Societário, destacamos os seguintes: 

NOVO MARCO REGULATÓRIO PARA ATIVIDADE DE ASSESSORIA DE INVESTIMENTO  

Em 14 de fevereiro de 2023, a CVM publicou as Resoluções nº 178 e 179 que passaram a disciplinar a atividade dos assessores de investimento (anteriormente denominados agentes autônomos de investimento), tendo sido revogada a Resolução CVM nº 16, de 09 de fevereiro de 2021, anteriormente responsável pela disciplina da atividade, e alterada a Resolução CVM nº 35, de 26 de maio de 2021. 

Esse novo marco regulatório trouxe diversas mudanças para o exercício das atividades dos assessores de investimento, dentre as quais destacamos aquelas que trazem maior foco em transparência para a remuneração dos assessores de investimento, bem como potenciais conflitos de interesses; a flexibilização do regime de exclusividade dos assessores de investimento, com impacto na possibilidade de escolha do tipo societário das sociedades de assessores de investimento, a admissão de sócios capitalistas e a formação de grupo econômico; além da criação do diretor responsável do assessor de investimento pessoa jurídica 

Ainda, se pôs um fim ao objeto social exclusivo de assessoria de investimento, possibilitando o exercício de outras atividades dentro da mesma sociedade (mesmo CNPJ), e foi remodelada a forma de contratação de assessores de investimento pessoas naturais, não exigindo mais que estes se tornem sócios da respectiva sociedade.  

Nossos Informativos anteriores sobre o tema podem ser acessados aqui: Novo Marco Regulatório para a Atividade de Assessor de Investimento; Resolução CVM 178 e Novas Possibilidade para Estruturas de Partnership em Sociedades de AI; e Resolução CVM 178 e as Novas Formas de Contratação de Assessores de Investimento. 

PROJETO DE LEI Nº 2.925/2023 E OS LITÍGIOS SOCIETÁRIOS  

Em 02 de junho de 2023 foi apresentado ao Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 2.925/23 (“PL 2.925”), elaborado pela Secretaria de Reformas Econômicas do Ministério da Fazenda, que altera a Lei nº 6.385, de 7 de dezembro de 1976 (“Lei da CVM”), e a Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976 (“Lei das S.A.”), o qual propõe, dentre outras alterações: (i) a expansão do sistema de tutela privada de direitos de investidores no mercado de valores mobiliários; e (ii) a aprimoração da transparência nos processos arbitrais societários. 

Fruto de discussões sobre as limitações e efetividade dos instrumentos previstos em lei para tutela dos acionistas e do estudo publicado em 2020 pela OCDE, em parceria com o Ministério da Fazenda e a CVM, denominado Private Enforcement of Shareholder Rights: a Comparison of Selected Jurisdictions and Policy Alternatives for Brazil, o PL 2.925 tem o principal intuito de viabilizar o acesso dos investidores ao Poder Judiciário e às câmaras arbitrais, seja por meio de demandas coletivas ou individuais, pretendendo-se a reparação de danos causados aos investidores de companhias abertas por seus acionistas controladores e administradores. 

Nesse sentido, o PL 2.925 estende a tutela coletiva ao incorporar investidores como legitimados ativos em processos de reparação de danos, ao contrário da legislação atual que prevê essa legitimidade para a CVM, Ministério Público etc., os quais poderão propor, em nome próprio, ação civil coletiva de responsabilidade pelos danos sofridos, desde que possuam pelo menos 2,5% dos valores mobiliários da mesma espécie ou classe, ou títulos mobiliários com valor de, pelo menos, R$ 50 milhões. Inspirado no modelo norte-americano, a ação coletiva societária englobará e vinculará os titulares da mesma espécie ou classe de valores mobiliários, exceto aqueles que se manifestarem em sentido contrário, adicionado a um conceito brasileiro que envolverão pagamento de um prêmio para o investidor que ajuizar a ação e honorários de sucumbência para seus advogados. 

Embora não decorra de lei, é comum que os procedimentos arbitrais, em que se são discutidos os principais conflitos societários, sejam protegidos por cláusulas de confidencialidade. Propõe-se então, visando a ampliar o acompanhamento dos processos pelos acionistas e investidores, bem como reduzir a assimetria informacional, que a CVM disponha sobre os limites do caráter público dos procedimentos arbitrais de direito societário de caráter coletivo, favorecendo o ingresso de outros investidores prejudicados e uniformidade no desfecho dos casos. Em se tratando de conflitos societários envolvendo companhias abertas, as câmaras arbitrais deverão dar publicidade a seus precedentes, divulgando-os em seus sites. 

CVM MANIFESTA ENTENDIMENTO SOBRE REQUISITOS PARA AÇÃO DE RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRA CONTROLADOR  

Dentre os mecanismos para proteção contra abusos praticados por seus administradores e controladores e que causem prejuízos à companhia, a Lei das S.A. prevê a ação de responsabilidade contra os administradores (art. 159) e ação de responsabilidade contra os controladores por danos causados por atos praticados em violação a seus deveres ou com abuso de poder (art. 246). 

Discute-se então se a ação de responsabilização contra os controladores (art. 246) dependeria ou não de prévia manifestação dos acionistas em assembleia geral, estendendo-se a previsão legal continua no art. 159, caput, da Lei das S.A. no que tange à ação a ser proposta contra o administrador. 

Em mais de uma oportunidade, o STJ se manifestou no sentido de que a prévia aprovação em assembleia geral seria requisito indispensável para a propositura de ação de responsabilização contra os controladores (REsp 1.214.497/RJ e REsp 12.207.956/RJ) 

Chamada a se manifestar sobre o tema, a CVM, em consulta realizada no Processo Administrativo nº 19957.007423/2021-12, se manifestou em sentido contrário ao entendimento do Poder Judiciário em março deste ano, confirmando o seu entendimento de que não é necessária a deliberação prévia da assembleia geral para que os acionistas tenham direito de ingressar com a ação em nome da companhia contra o controlador.

O entendimento reiterado da CVM destaca que exigir aprovação prévia pela assembleia geral, além de não encontrar respaldo na própria Lei das S.A., resultaria em prejuízo aos minoritários, na medida em que os controladores poderiam barrar a aprovação do ajuizamento da ação contra eles próprios em assembleia geral. 

DISPENSA DE ASSINATURA DE TESTEMUNHAS EM CONTRATOS ASSINADOS ELETRONICAMENTE 

Em 14 de julho de 2023 entrou em vigor a Lei nº 14.620 de 2023, que incluiu um novo parágrafo ao artigo 784 da Lei nº 13.105 de 16 de maço de 2025 (“Código de Processo Civil”), que dispensa a assinatura de testemunhas em contratos assinados eletronicamente quando sua integridade for conferida pelo provedor de assinatura.  

A alteração legislativa facilitou a exequibilidade dos contratos particulares, viabilizando aos contratantes que se utilizem da via executiva judicial, sendo este o procedimento mais célere para satisfação da obrigação.  

Nosso Informativo anterior sobre o tema pode ser acessado aqui: Dispensa de Assinatura de Testemunhas em Contratos Assinados Eletronicamente

CVM PUBLICA ESTUDO SOBRE DISPENSA DE INSTALAÇÃO DE CONSELHO FISCAL EM COMPANHIAS ABERTAS DE PEQUENO E MÉDIO PORTE  

A CVM publicou, em junho de 2023, estudo elaborado pela Assessoria de Análise Econômica e Gestão de Riscos denominado “Revisão da obrigatoriedade do Conselho Fiscal em companhias de pequeno e médio porte”, o qual avalia, a partir de evidências teóricas e empíricas, a dispensa ou a modulação da instalação de conselho fiscal por assembleia geral para companhias de pequeno e médio porte (com receita bruta anual de até R$ 500 milhões), conforme permitido pelo Marco Legal das Startups (Lei Complementar nº 182/21). 

O estudou analisou a problemática em três pontos focais, sendo estes: (i) os benefícios e os custos de observância; (ii) a representatividade dos acionistas minoritários na fiscalização das companhias; e (iii) a comparação com outros mecanismos societários que possuem função fiscalizatória, bem como a governança corporativa comparada em outras jurisdições (como Estados Unidos, França, Alemanha, Reino Unido, Itália e Portugal). 

O estudo, que se baseou nas metodologias do custo-benefício e do custo padrão, constatou que, em média, o custo anual para o conselho fiscal de uma companhia aberta de menor porte é da ordem de R$ 250 mil, o que é próximo ao seu custo regulatório médio, o que pode ser considerando elevado. 

A conclusão do estudo é no sentido de que, caso a CVM opte por regulamentar o tema, conforme previsto no Marco Legal das Startups, seja aplicada a seguinte alternativa: dispensa da obrigatoriedade da instalação do conselho fiscal via assembleia geral para todas as companhias abertas de menor porte mediante a possibilidade de eleição pelos minoritários de uma cadeira no conselho de administração. Desse modo, seria garantido aos minoritários participação efetiva na fiscalização de tais companhias. 

Destaca o estudo, ainda, que o conselho fiscal é uma instância complementar às demais de governança previstas para companhias, razão pela qual a sua existência pode ser benéfica à companhia em si e aos acionistas em geral. 

Ressaltamos que o estudo em questão não gerou efeitos imediatos sobre a regulamentação aplicável, se tratando somente de uma recomendação caso a CVM venha a regulamentar o tema.  

STJ DECIDE PELA NÃO OBRIGATORIEDADE DE PUBLICAÇÃO DE DEMONSTRAÇÕES FINANCEIRAS POR SOCIEDADES LIMITADAS DE GRANDE PORTE 

A Lei n.º 11.638, de 28 de dezembro de 2007, dispõe, em seu artigo 3º, sobre a aplicação das disposições previstas na Lei das S.A. no que se refere à escrituração e elaboração demonstrações financeiras, bem como obrigatoriedade de auditoria independente por auditor registrado na CVM, para as sociedades de grande porte, ainda que não constituídas sob a forma de sociedade por ações. Nos termos da mesma lei, considera-se sociedade de grande porte a sociedade ou conjunto de sociedades sob controle comum que tiver, no exercício social anterior, ativo total superior a R$ 240 milhões ou receita bruta anual superior a R$ 300 milhões. 

A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu de forma unânime, em 21 de março de 2023, em Recurso Especial, pela não obrigatoriedade de publicação no Diário Oficial e em jornal de grande circulação, previamente ao arquivamento na Junta Comercial, de demonstrações financeiras pelas sociedades limitadas de grande porte, por falta de previsão legal. 

A decisão proferida pelo STJ apenas fortalece o entendimento anterior apresentado pelo Ofício Circular SEI n.º 4742/2022/ME, de 25 de novembro de 2022, emitido pelo Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração (DREI), que instruiu que as publicações das demonstrações financeiras das sociedades limitadas de grande porte são meramente facultativas.

 

Este informativo foi elaborado exclusivamente para nossos clientes e apresenta informações resumidas, não representando uma opinião legal. Dúvidas e esclarecimentos específicos sobre tais informações deverão ser dirigidos diretamente ao nosso escritório.

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